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Transferência: Do apaixonamento ao amor pelo saber

  • Foto do escritor: Circular Psicanálise
    Circular Psicanálise
  • 26 de nov. de 2024
  • 3 min de leitura

Por: Lucas Nogueira

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O ser humano sempre foi permeado por questões que tocam o amor, seja ele o amor fraterno ou sexual. Pela ausência ou excesso de algum amor, as pessoas tendem a sofrer e buscar diversas soluções para contornarem suas angústias e alcançar a dignidade do amor, ou seja, encontrar sua justa medida. Na psicanálise, o amor também está presente na teoria, sendo ele um elemento essencial para um dos seus principais conceitos: a transferência.


O que chamamos de transferência em psicanálise, é uma modalidade amorosa desenvolvida por Freud em 1912, em seu texto “Sobre a dinâmica da transferência”; neste artigo, o autor conclui a partir da experiência clínica, que os pacientes em tratamento reeditam na pessoa do analista, as imagos das figuras de amor dos anos da infância. Desse modo, o paciente vai projetando na cena analítica suas expectativas inconscientes da necessidade amorosa.


Sabemos que um tratamento psicanalítico, geralmente, pode começar por alguma identificação por parte do paciente, seja um traço da personalidade do analista, seja através da indicação de alguém que ele já conhece, pelo próprio nome e gênero ou qualquer outro significante que o faça escolher especificamente aquela pessoa para escutá-lo. Essa escolha nunca é feita ao “acaso” ou está isenta de significações.


O analista, assim, tem como matéria de trabalho o amor inconsciente manifestado pela transferência (atuações), onde se torna possível extrair das camadas e resistências contidas no “apaixonamento” do sujeito, seu drama singular e a história que o constituiu. O amor de transferência, portanto, é um dos maiores aliados na condução do tratamento, e, a maior fonte de resistência ao saber inconsciente.


No entanto, depois de Freud, também temos a noção de transferência no ensino lacaniano. Para o psicanalista francês, o amor tende a caminhar em direção ao saber, onde o sujeito supõe no Outro, um saber sobre sua própria verdade. Para Lacan, o sujeito endereça-se ao analista para que este lhe nomeie o objeto causa de seu desejo, e assim, complete a falta no Outro, impedindo-o de se haver com a sua própria condição desejante (Gobatto, 2001).


Na busca pelo objeto que daria consistência imaginária ao desejo, via transferência, o analista provoca e indica ao sujeito pelo seu silêncio, um enigma a decifrar, desvelando assim a condição faltosa de todo ser falante. O amor é uma significação do vazio, como nos ensina Lacan, por isso, está sempre causando aos sujeitos.


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[...] Nesse ponto onde a metonímia significante paralisa-se surge o amor como uma significação ao vazio, o amor endereça-se ao analista não simplesmente e ingenuamente como objeto amado, mas sobretudo como um "eu te amo pelo saber que você possui sobre mim", ou "eu te amo porque eu sei que você é depositário do objeto que procuro". O amor destinado ao analista não é algo a ser interpretado, pois ele já é uma interpretação do sujeito, interpretação onde ele atrela o vazio (não-saber, questão, enigma etc.), o amor e o saber. Ninguém vem em análise porque está apaixonado pelo analista, mesmo que tal caricatura possa ocorrer (GOBATTO, 2001, p. 106).

 


Referências:


FREUD, Sigmund. Sobre a dinâmica da transferência (1912) In: FREUD, Sigmund. Fundamentos da Clínica Psicanalítica: Obras Incompletas de Sigmund Freud. Belo Horizonte: Autêntica, 2018. p. 107-118. Tradução: Claudia Dornbusch.

 

GOBBATO, Gilberto Gênova. Transferência: amor ao saber. Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, [S.L.], v. 4, n. 1, p. 103-114, jun. 2001. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1516-14982001000100007.


LACAN, Jacques. O seminário, livro 8: A transferência (1960-1961). Rio de Janeiro: Zahar, 1992.

 

 
 
 

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